Prof. Dr.
Antonio de Pádua Dias da Silva
Universidade
Estadual da Paraíba
Programa de Pós-Graduação em Literatura e Interculturalidade
Falar
sobre mulheres e direitos, seja do ponto de vista real ou das artes como a
literatura, pode parecer ser um tema “batido”, que não mais impacta, salvo
quando são trazidas à tona imagens que exigem a Lei Maria da Penha: o assunto, de tão discutido em nosso meio,
parece, aparentemente, ter perdido a força, de forma que não vale mais a pena
discuti-lo. Não vale? Quem disse que não vale? As muitas pessoas que dizem isso
precisam estar atentas a si próprias e às outras, antes de estabelecer uma
ideia sobre um coletivo. Não trago aqui uma fala acadêmica, mas uma fala a
partir da experiência minha com muitas mulheres – minha mãe, minhas avós,
minhas irmãs e tias, minhas professoras, minhas namoradas e mulheres, minhas
amigas e alunas, minhas colegas de trabalho, minha orientadora de doutorado, do
pós-doutorado, as mães dos meus amigos...Meu objetivo é discutir mulheres na
literatura, como elas são vistas por escritoras; estabelecer um diálogo entre
as imagens que delas são feitas e os contrapontos com a vida cotidiana, tudo
isso no intuito de refletir sobre várias posturas adotadas por mulheres no
cotidiano e as implicações que as tomadas de decisões causam. Inicio a minha
fala com dois pequenos poemas, talvez desconhecidos da maioria. São poemas
bastante reveladores de um momento histórico em que a “redenção” para muitas
mulheres estava no casamento. A forma como ele se dava, porém, insistia numa
operação em cadeia que liberava as mulheres de uma prisão, como dizem muitas
feministas, para introduzi-las em outra, ou seja, saíam dos domínios do Pai e
entravam nos domínios do Marido. Vejamos o poema:
O Peso do
buquê
Valéria Vilela[Conduzida] pelo pai
[no vestido da noiva
que um dia foi sua] mãe
ela [carregou] o buquê
Ai, o peso!
as margaridas trêmulas
até o altar
Era primavera
Um cravo tocou Bach
As
imagens que surgem neste pequeno poema apontam para um momento de nossa
história: aquele em que o CASAMENTO ERA O DESTINO, uma tradição cultural para
se ocupar os lugares sociais (ou se esvaziar, se lacunar, para as muitas
mulheres). A imagem do pai CONDUZINDO, dando, entregando, confiando a filha a
outro homem; a imagem da mãe, ausente no texto como sujeito agente, mas
lembrada na tradição que faz a filha casar no vestido (molde, forma, código,
modo de ser) que um dia foi da mãe,
ou seja, há uma REPETIÇÃO de código neste verso; tudo isso são imagens
carregadas de dor: AI, O PESO! O objeto/apetrecho de forma bela e agradável,
leve e perfumado, a ser lançado como talismã de sorte para outras mulheres é,
em Valéria Vilela, repensado em seu impacto, quando o CASAMENTO quer dizer apenas
submissão, domínio do homem sobre a mulher, tradição de um código que descarta
as feminilidades em prol das masculinidades. O buquê tem um peso, metáfora para
todo o AZAR que seria, na visão da poeta, o peso de uma tradição que anula um
dos casais.
Adélia
Prado, em um pequeníssimo poema, intitulado Resumo, assim exibe sua visão de sujeito mulher incrustado em uma
sociedade cujas normas sociais também apontam para a realização da mulher no
casamento como destino e os impactos que esse destino causava nas mulheres
assujeitadas ao código vigente:
Resumo
Adélia
Prado
Gerou
os filhos, os netos,
deu
à casa o ar de sua graça
e
vai morrer de câncer.
O
modo como pousa a cabeça para um retrato
é
o de que, afinal, aceitou ser dispensável.
Espera,
sem uivos, a campa, a tampa, a inscrição:
1906-1970
SAUDADE
DOS SEUS, LEONORA.
Que
funções as mulheres exercem hoje, quando decidem por um casamento? Que destino
agregam a si, que peso o buquê lhes conferem, são dispensáveis como vê Adélia
Prado? Fernando Pessoa, apesar da sua ironia, do seu ateísmo ou agnosticismo;
apesar de sua conflituosa situação afetivo-sexual; ao falar sobre as pessoas do
céu (deus, espírito santo, menino Jesus e a virgem Maria), assim se expressa
quanto à Virgem Maria, no Poema VIII de O
Guardador de rebanhos: “Num meio-dia de fim de Primavera/ Tive um sonho
como uma fotografia./ Vi Jesus Cristo descer à terra./ [...]O seu pai era duas
pessoas –/ Um velho chamado José, que era carpinteiro,/ E que não pai dele;/ E
o outro pai era uma pomba estúpida,/ A única pomba feia do mundo/ Porque não
era do mundo nem era pomba./ E a sua mãe não tinha amado antes de o ter./ [...]
Não era mulher: era uma mala/ Em que ele tinha vindo do céu”. As mulheres que
tiveram de abraçar o casamento como destino, em um ou outro momento, algumas em
todos os momentos, se sentiram assim, MALAS, barrigas ou máquinas de fazer
machos – como disse Durval Muniz Albuquerque Júnior. Machos para os senhores!
Machos para o comando! Machos para a guerra, para a política, para as finanças,
para os bancos e a economia em geral.
Machos para emprenhar as mulheres até que elas lhes dessem o filho
homem, herdeiro direto e natural de seus bens, a quem elas também passariam a
render graças. Os homens, desta forma, mantinham o comando das situações,
aprisionando as mulheres em suas fortalezas domésticas. “Gerar filhos, netos,
dar à casa o ar de sua graça”: eis o contentamento dessas mulheres (pensamento
machista); servir como malas, transporte, máquinas reprodutoras, “pousar para
um retrato” em que a figura materna aparecia como coadjuvante enferma de uma
instituição (casamento) da qual não gozava benefícios. A lembrança, na lápide,
assim, seria a recompensa, a paga pela geração de filhos, reconhecimento do
esposo, perpetuação (já não mais?) de uma longa tradição em que os direitos da
mulher e os direitos humanos estavam longe de serem percebidos, reivindicados.
Depois
de passadas várias fases de gestão do corpo, de incorporação diárias de novas
ideias, de estudos e formação de mulheres em vários setores das atividades
antes apenas masculinas, como são vistas pelas escritoras? As mudanças
culturais, sociais, pessoais avançaram em que sentido, já que falar de mulheres
pertencentes a uma ideologia passada parece não fazer tanto sentido, salvo para
comparar estilos, para lembrar a dor e evitar os destinos lacunares? É evidente
que a cada dia, quando lemos um jornal, abrimos uma revista, assistimos a
telejornais, escutamos rádios, navegamos na internet, ouvimos as pessoas com
quem nos relacionamos estão em evidência alguns fatos relacionados às mulheres,
seja para mostrar pontos considerados já superados e vistos afirmativamente,
seja para reivindicar melhor atuação da sociedade nas ainda injustiças sofridas
por mulheres: como disse antes, a Lei
Maria da Penha, tal qual ladainha, é invocada todos os dias para resolver
questões vinculadas às agressões e violências cometidas contra mulheres,
desfecho que se apresenta não tão longe do “Peso do Buquê”, e agrega um outro
peso: as parcerias amorosas, a filharada sem pai, a dependência das mulheres aos
pais (geralmente, em comunidades mais dependentes dos vários incentivos
governamentais), a administração sozinha de um lar, liberdades adquiras por
mulheres e outros coletivos que anunciam um paradoxo: 1) o conceito de
liberdade para as mulheres é bastante aproveitado, vez que garante a igualdade de direitos (que digam as mulheres se isso é
tão fácil no dia a dia, se ocorre da mesma forma como corre solta na boca das
gentes!), são donas de seus corpos (transam,
engendram, abortam, relacionam-se com ele da forma que gostam), não necessitam de um marido que as carregue
(Inês Pereira, não querendo ser comandada pelo marido, fala: “Mais quero um
asno que me leve, do que um cavalo que me derrube” – 1523), ou seja, estão gerindo
suas próprias vidas e 2 ) As conquistas adquiridas criam condições mínimas de
conforto para muitas mulheres: trabalhar para manter o lar, educar os filhos (quando
os tem) sozinhas (há as que dividem esta atividade com os companheiros ou
companheiras), tem pouco momento de lazer, devido à jornada de trabalho
semanal, o final de semana para por ordem em casa e estar com os parentes,
geralmente filhos, às vezes demorando a encontrar um companheiro ou uma
companheira, descuidando de si, em muitos momentos. Em tese, tem que resolver
tudo sozinhas, porque os laços de dependência entre mulheres e homens, mulheres
e mulheres já não soa mais palatável numa era em que todos assumimos uma
singularidade, uma liberdade e uma importância íntimas, nossa apenas, problema
meu, eu que cuido, eu que resolvo, eu
não quero o outro a me importunar.
Um
dos aspectos em que pesa o direito de ser e estar mulher em nosso tempo, e me
refiro ao hoje, é quanto à solidão do corpo. Quando a companhia (de um homem ou
de uma mulher) ainda é inexistente, as formas de se relacionarem com o corpo
são várias, principalmente quando o modo de estar sozinha no cotidiano é
espontâneo, desejado. Que corpos de desejo, de prazer são produzidos por
mulheres de hoje, quando a liberdade é alcançada (não só para as mulheres)? Há
um trecho de uma música que diz o seguinte: “Não sei o que fazer com essa tal
liberdade”. O que fazemos com ela, a liberdade, se é que acreditamos nela e
dela desfrutamos? Um dos impactos na vida dessa “nova mulher”, mais autônoma,
mais decidida, menos dependente do outro do seu afeto é discutido no conto que
se segue:
SÃO
CRISTÓVÃO
Ivana
Arruda Leite
Eu
sozinha nesse bar, um pires de azeitona à minha frente e uma cerveja quente
pela metade. Largada nesse canto da vida
é difícil acreditar que Rodrigo Santoro vai passar por aqui e se apaixonar por
mim. Mas vai.
(Ao homem
que não me quis)
A
solidão é um dos impactos causados pelo direito buscado à liberdade de ser e de
estar. Se o casamento como destino machucava, fazia doer, aparentava e
apresentava uma garantia: uma companhia, um homem, filhos, se fosse o caso, a
segurança do lar, o aconchego de vários momentos. Longe dele, o livre trânsito,
o não dar satisfação a ninguém, a boa vida de pessoa livre para se relacionar
com quem quiser. Mas a solidão é mais agravante para aquelas que não se submetem, aquelas que tem uma consciência mais apurada de sua
condição, situação, existência. A Ordem garante a segurança do sujeito; a
liberdade invocada, adquirida, de direito, resvala para picos de assombração
por fantasmas, ou seja, as pessoas (não só as mulheres) adoecem de estar só, de
demorar a ter companhia. Apesar de se relacionarem tranquilamente de forma
passageira, efêmera, chegam a um momento de reflexão sobre em que porto ancorar
(para as que querem), que rumo reorganizar para se obter os momentos de
felicidade. Rodrigo Santoro, como metáfora, talvez não esteja no ambiente de
liberdade que ela pensa ser. Se não aparece o desejado, há mulheres, outras,
que se “viram” de tantas outras formas, não mais se iludindo quanto aos gestos
do corpo e da sexualidade centradas no desejo heterossexual, como quer a norma:
Angélica
Cida
Pedrosa
O
pênis de angélica
era
de plástico
passou
a vida a esfregar-se no espelho
eis
a sina
mulher
ou homem
injusto
desígnio
para
quem precisa-se inteiro por dentre as coxas
voz
rouca sob os lençóis
desejo
de iguais
porra
bocetas
também são objetos de encaixe
Se
o objeto de desejo dessas mulheres que saíram da tradição machista, patriarcal,
falocêntrica pode ser a sua igual, há aquelas que revertem situações de
conflito, de domínio, de ética e cultura, para garantir o seu direito ao
prazer, à vida, como o sujeito do conto a seguir:
Receita
para comer o homem amado
Pegue
o homem que te maltrata, estenda-o sobre a tábua de bife e comece a sová-lo
pelas costas. Depois pique bem picadinho e jogue na gordura quente. Acrescente
os olhos e a cebola. Mexa devagar até tudo ficar dourado. A língua, cortada em
minúsculos pedaços, deve ser colocada em seguida, assim como as mãos, os pés e
o cheiro-verde. Quando o refogado exalar o odor dos que ardem no inferno, jogue
água fervente até amolecer o coração. Empane o pinto no ovo e na farinha de
rosca e sirva como aperitivo. Devore tudo com talher de prata, limpe a boca com
guardanapo de linho e arrote com vontade, pra que isso não se repita nunca
mais.
(Falo de
mulher)
O
conto em tela poderia soar como uma espécie de vingança contra a opressão, o
silêncio, a sujeição, os tantos atos de violência a que as mulheres, ao longo
dos séculos, tiveram que se submeter. Por outro lado, a vingança pode ser
deixada de lado, se percebermos que além dela há também um convite à filosofia
do tratamento igual, ou seja, não acatar ou se conformar com a violência ou
maltrato, mas tratar o “malfeitor” da mesma forma que ele agir (sem se separar
dele, mas estabelecer limites entre os direitos de um e de outro): tratamento
igual. Os termos do conto que foram selecionados para a “receita” denunciam um
alto grau culinário sendo preparado para derrocar o outro: pegar, jogar, acrescentar, mexer, empanar, servir, devorar e arrotar.
Articulados, dão o sabor da receita do tratamento igual na relação a dois, sem
perder de vista a vingança. Ou seja, um conto em que há uma alta carga de
explosivo ideológico pelos termos selecionados para a existência do conto.
Diante
dos direitos adquiridos, SELECIONAR parcerias afetivo-sexuais parece ser um
dado antigo, mas a ordem em que algumas mulheres se projetam, demonstra outra
configuração, quem sabe mais livre, talvez mais perigosa, plena de adrenalina,
de tensão, de tesão. Há mulheres da vida real que espelham essas mulheres da
ficção, como vê-se no trecho do conto extraído do recente Breviário de pornografia esquisotrans:
Sexo e pânico
– Moça, você tem que procurar bons encontros,
você só se mete em mau encontro, coisas que não te fazem bem, você tem que ser
mais seletiva com teus amores também, eu acho!
–
Eu que sei dos meus encontros, ta sabendo? E quer saber mais? Minha seleção é
assim, eu topo o que aparece na minha frente, ao invés de ficar esperando uma
princesa poetiza e a universitária que nem tu. Fica com a mão aí mesmo, não saí
daí...
–
Cala a boca, essa discussão vai acabar mal, você vai acabar com meu pau na tua
boca e ele ta todo sujo.
–
Tu ta com medo de mim? Ta com medo de que? Tu acha que eu sou um monstro sexual
é?
–
Metade do mundo tem sífilis e a outra metade tem Aids, você faz muito sexo,
deve ter algum dos dois, com certeza!
–
E se eu quiser te infectar, você vai fazer o que? Vai resistir? Eu preciso,
gatinho, eu preciso te infectar para melhorar desse pânico...Esse pânico que tu
sente do que não se enquadra no teu padrão de beleza e desejo. Só paninho
bonito, menininha gracinha, corpinho ajeitado. Preto, velho e sem dente nem
pensar, certo? Deve ser isso que tu chama de mau encontro.
(Breviário de pornografia esquisotrans –
para as pessoas do avesso)
Há
mulheres que optam pelo agenciamento de comportamentos e de atitudes que beiram
o perigo para uma maioria das pessoas, mas esta é uma forma de enfrentar a si
mesma, o seu corpo, o seu desejo, a sua forma de se subjetivar, de dar sentido
ao ser que elas são. Aterrorizar os homens, aterrorizar as companhias, tornar
mais tensa as relações parece ser uma segura forma de garantir a adrenalina
necessária para seu bem estar. Compartilhando dessa situação, Ivana Arruda
Leite assim se expressa:
A puta seletiva
Sou
uma puta muito seletiva. Escolho muito bem os homens que como. Se um deles pára
o carro e pergunta sobre camisinha, vou logo dispensando e mandando o sujeito
pastar.
–
Comigo só se for com o pé na morte, cara. Camisinha nem pensar.
(Falo de
mulher)
Quantas
mulheres há no mundo capazes de gerenciar suas vidas dentro das formas
singulares em que cada uma se subjetiva? O padrão social geralmente a incomodar
as mulheres é uma equação que dá certo, que resulta sempre em ações afirmativas
ou é dispensável o modo de pensar as mulheres dentro de estereótipos, presas ou
assujeitadas a unicamente discursos que valoram os grupos hegemônicos e as
pessoas nele perfiladas? Vale a pena investir na contra-educação, nos modos de
ser e de estar mulher, garantindo-se, a todo custo, a felicidade e segurança
esperadas? Ou é menos complexo esperar que grupos de poder e no poder legislem
em favor dos meus desejos, das minhas vontades, das minhas necessidades, embora
nem sempre o legislado me atinja, chegue até mim? Tornar-me sujeito de mim, em
todos os âmbitos, não culmina em muitas liberdades, liberalidades,
libertinagens, confusões de atitudes, resistências ao entendimento coletivo?
Plural, singular ou normal? O quê?
Sabemos
que são muitas as performances adotadas por mulheres em nosso tempo, todas elas
querendo demarcar territórios de acontecimentos da felicidade de grupos de
pertença. Há ainda aquelas mulheres que vivem em transição, ou que foram
educadas em uma tradição, convivem com outra geração, mas não se resolvem
dentro dos parâmetros das “pessoas ao avesso”, isto é, “despachadas”,
liberadas, afirmativas. Vejamos como os paradoxos de hoje ainda tornam muitas
mulheres distantes das grandes discussões e entendimentos do mundo e de si.
Patrícia
Cida
Pedrosa
é
especialista em filhos
deveria
ser contratada
por
reclames de televisão
e
os jornais poderiam colher depoimentos
sobre
como ensinar uma empregada
a
engomar 10 fraldas de uma única vez
teve
3 filhos
jéssica
marina e Victor Junior
sabe
tudo sobre febre papinhas cocozinhos risinhos
bonequinhas
carrinhos palhacinhos sapatinhos joguinhos
roupinhas
festinhas de aniversário letrinhas numerozinhos
velocípedes
curso de férias esporte queda de bicicleta
matemática
português história geografia cidadania
aula
de reforço amigos indesejáveis lan house
passeios
ao shopping conta de telefone alta
namoro
nas escadas amasso no sofá
comprimidos
de ecstasy
patrícia
é especialista em filhos
mas
não sabe o que fazer com o piercing que jéssica
pôs
nos grandes lábios
o
amor de marina por Felipa
e
a decisão de Victor Junior não seguir a carreira do pai
junto
à empresa vitorvitoria
Apesar
de toda uma onde de direitos adquiridos, de liberalidade e políticas
afirmativas para as mulheres, há aquelas que desconhecem o universo em que se
sentem existindo, em que existem, em que sofrem. Há mulheres apegadas a ordens
antigas, sofrendo no tempo a existência vencida diante dos filhos e dos outros
que acompanham em seu cotidiano. Resistem ou sobrevivem no silêncio de si
mesmas. Assim como, ainda hoje, por mais que tenhamos a Lei Maria da Penha, sofrem com os casos como o que se segue:
Tereza
Cida
Pedrosa
mãos
enormes
as
de geraldo
tão
grandes que não cabem
no
corpo magro de Tereza
quando
casaram
tinham
planos de comprar uma casa
de
varanda
e
passar uma semana em bariloche
neste
tempo
os
peitos de Tereza
cabiam
nas mãos de geraldo
mãos
enormes
as
de geraldo
tão
grandes que se espremem nas algemas
e
não podem mais acenar para Tereza
que
nesta hora é conduzida
no
carro do IML
para
exame de corpo de delito
sob
suspeita de estrangulamento
Como
sobreviver, mulheres (e homens), em um mundo e um momento que muda numa constância,
que convive com tantas diferenças, modos de sentir, de ser, de estar, de
filosofar, de agir, de trabalhar, de sentir prazer, de ser eu? Tantas vozes e
discursos. Como filtrar ou o que filtrar disso tudo para obtermos uma afirmação
de nós mesmos dentro de grandes engrenagens socioculturais? É preciso ter
força, é preciso ter raça, é preciso saber estar vivo para conviver com tanta
liquidez deste momento em que existimos.
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